segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Teste de Turing

O teste de Turing, também conhecido por “jogo de imitação”, foi proposto por Alan Turing como um modo concreto de ajuizar se os computadores são inteligentes ou se podem pensar. O teste consiste no seguinte: Um humano, o interrogador, faz perguntas a outro humano e a um computador, sem saber qual é qual (as perguntas são feitas sem os ver, por email ou chat, por exemplo) e tenta com base nas respostas saber qual é o computador e qual é o humano. Se o computador conseguir “enganar” o interrogador, ao fim de um certo número de perguntas e respostas, i.e., se tiver uma conversa com o interrogador que o tornasse indistinguível do humano, então passa o teste.Para Turing, um computador que passasse o teste um número de vezes e com uma boa taxa de sucesso, não seria uma mera simulação, mas sim seria genuinamente inteligente e teria uma mente. Quando propôs o teste, em 1950, Turing avançou a ideia de que não faltaria muito até que os computadores começassem a ter bons resultados no teste. Até hoje nenhum computador passou de um modo claro o teste de Turing.

Quarto Chinês (o Argumento do)

O argumento do quarto chinês, avançado por John Searle em 1980 num artigo intitulado “Minds, Brains and Programs”, pretende mostrar que a implementação de um programa de computador não é por si só suficiente para a instanciação, por parte dos computadores, de estados mentais genuínos. Searle ataca assim uma tese que considera central no projecto de investigação que denomina de Inteligência Artificial forte: Que um computador adequadamente programado tem estados cognitivos genuínos. Para refutar esta tese, Searle elabora uma experiência mental com o objectivo de mostrar um computador adequadamente programado a executar o seu programa (a implementar o seu programa) e no entanto não há qualquer cognição relevante.Imagine-se que existe um programa para falar chinês que o faça tão bem como qualquer falante nativo de chinês e portanto indistinguível destes nesta habilidade (Que passasse então o Teste de Turing para falar chinês). Imagine-se, que um de nós que não saiba falar chinês esta fechado num quarto, onde há caixas com símbolos chineses, um grande livro em português, onde está escrito o programa de computador para falar chinês, e uma entrada no quarto, para os inputs e outputs. Nós, fechados no quarto, estamos a executar o programa de computador; de vez em quando são introduzidos no quarto uma série de símbolos, as perguntas feitas pelos falantes de chinês fora do quarto. Ao recebe-las consultamos o grande livro, o programa, e pegando em outros tantos símbolos, fazemos as respostas chegar lá fora. Para as pessoas fora do quarto, como estamos a implementar o fantástico programa que fala chinês, somos de facto indistinguíveis de um falante nativo, mas nós dentro do quarto não entendemos uma palavra de chinês, e segundo Searle, mesmo de pois de correr o programa, continuamos sem perceber uma palavra. Mas, pergunta-se Searle, se nós dentro do quarto não temos qualquer compreensão de chinês, como pode um computador a implementar o mesmo programa compreender chinês? Afinal não há nada que o computador tenha que eu não tenha; é mais do mesmo, mas mais rápido.Nas últimas três décadas este foi talvez o argumento filosófico mais debatidos nas ciências cognitivas, visto pôr em causa a teoria computacional da mente e o projecto da inteligência artificial forte.

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Damásio e o caso de Phineas Gage

O Caso de Phineas Gage

Phineas Gage era um jovem supervisor de construção de ferrovias da Rutland e Burland Railroad, em Vermont, EUA. Em 1848 de setembro, enquanto estava a preparar uma carga de pólvora para explodir uma pedra, ele calcou uma barra de aço inadvertidamente no buraco. A explosão resultante projectou a barra, com 2.5 cm de diâmetro e mais de um metro de comprimento contra o seu crânio, a alta velocidade. A barra entrou pela bochecha esquerda, destruiu o olho, atravessou a parte frontal do cérebro, e saiu pelo topo do crânio, do outro lado. Gage perdeu a consciência imediatamente e começou a ter convulsões. Porém, ele recuperou a consciência momentos depois, e foi levado a um médico local, Jonh Harlow que o socorreu. Incrivelmente, Phineas Gage falava e podia caminhar. Ele perdeu muito sangue, mas depois de alguns problemas de infecção, não só sobreviveu à horrenda lesão, como também se recuperou bem, fisicamente.






Porém, pouco tempo depois Phineas começou a ter mudanças surpreendentes na personalidade e no humor. Ele tornou-se extravagante e anti-social, praguejador e mentiroso, com péssimas maneiras, e já não conseguia manter-se num trabalho por muito tempo ou planear o futuro. "Gage já não era Gage", disseram seus amigos.



Ele morreu em 1861, treze anos depois do acidente, sem dinheiro e epiléptico, sem que uma autópsia fosse realizada ao seu cérebro. O médico que o atendeu, John Harlow, entrevistou amigos de parentes, e escreveu dois artigos sobre a história médica reconstruída de Gage, um em 1948, intitulado "Passagem de uma Barra de Ferro Pela Cabeça ", e outro em 1868, intitulado "Recuperação da Passagem de uma Barra de Ferro Pela Cabeça ".
Phineas Gage tornou-se um caso clássico nos livros de ensino de neurologia. A parte do cérebro que ele tinha perdido, os lobos frontais, passou a ser associada às funções mentais e emocionais que ficaram alteradas. Harlow acreditava que, "o equilíbrio entre as faculdades intelectuais e as propensões animais parecem ter sido destruídas".



O crânio dele foi recuperado e preservado na Universidade de Harvard. Mais recentemente, dois neurobiologistas portugueses, Hanna e António Damásio da Universidade de Iowa, utilizaram computação gráfica e técnicas de tomografia cerebral para calcular a provável trajetória da barra de aço pelo cérebro de Gage, e publicaram os resultados em Science, em 1994. Eles descobriram que a maior parte do dano deve ter sido feito à região ventromedial dos lobos frontais em ambos os lados. A parte dos lobos frontais responsável pela fala e funções motores foi aparentemente poupada. Assim eles concluíram que as mudanças no comportamento social observado em Phineas Gage provavelmente foram devidos a esta lesão, pois observaram o mesmo tipo de mudança noutros pacientes com lesões semelhantes, causando déficits característicos nos processos de decisão racional e de controle da emoção.
"Gage foi o início histórico dos estudos das bases biológicas do comportamento", disse António Damasio.

terça-feira, 13 de outubro de 2009

Freud e o Desenvolvimento

FREUD E O DESENVOLVIMENTO

Para Freud, o desenvolvimento humano e a constituição do aparelho psíquico são explicados pela evolução da psicossexualidade.

Estádios de Desenvolvimento:

Estádio Oral (0-12/18 meses):
O ser humano nasce com id, isto é, um conjunto de pulsões inatas;
O ego forma-se, no primeiro ano de vida, de uma parte do id que começa a ter características próprias.
O estádio oral é constituído por um período em que a criança é muito passiva e dependente e outro, em que a criança é mais activa e pode mesmo morder o seio ou o biberão. O desmame corresponde a uma frustração que vai situar a criança em relação à realidade do mundo.



· Estádio Anal (12-18 meses 2/3 anos):
o A maturação e o desenvolvimento psicomotor vão permitir à criança reter ou expulsar as fezes/urina no estádio anal.
o A zona erógena é a região anal e mucosa intestinal. A estimulação dá prazer mas as contracções musculares podem provocar dor, o que cria uma ambivalência.
o A criança é mais autónoma.
o A ambivalência existe também na forma como a criança hesita entre ceder ou opor-se às regras de educação.

· Estádio Genital (dps da puberdade):
o Vai reactivar a sexualidade adormecida durante o período de latência. No estádio genital retomam-se as problemáticas do estado fálico, como o complexo de Édipo.
o A puberdade traz novas pulsões sexuais genitais.
o O adolescente autonomiza-se da família.
o Alguns adolescentes, regridem a fases anteriores. Através do ascetismo, o adolescente nega o prazer, através de disciplina e isolamento. Pela intelectualização ou racionalização, procura esconder aspectos emocionais do processo adolescente.


Id - constituído por todos os impulsos biológicos como a fome/sede/sexo, que exigem satisfação imediata. É o fundamento da sobrevivência individual ou da espécie.

Ego - é o elemento decisor dos conflitos travados entre o id e o superego. Constitui o fundamento da personalidade humana. Desenvolve-se à medida que a criança vai experimentando e se vai apercebendo de privações e recusas do mundo exterior. Orienta as pulsões de acordo com as exigências da realidade. Tem um papel de árbitro na luta entre as pulsões inatas e o meio. Conta com a ajuda de mecanismos de defesa.

Superego - constituído por um conjunto de regras e de proibições impostas primeiramente pelos pais e depois pela sociedade.

Piaget e o desenvolvimento

Jean Piaget revolucionou a teoria da psicologia intelectual.

Piaget interessava-se por epistemologia genética, que pretende estudar como se estrutura o conhecimento.

O desenvolvimento intelectual está relacionado com a génese do conhecimento à Psicologia Genética

O organismo tem, ao nascer, um património genético que permite interagir com as experiências que vão acontecendo.

Piaget é um construtivista e interaccionista, pois defende uma posição que não é inatista, nem empirista, dando ao sujeito um papel activo na construção do conhecimento e desenvolvimento.

O desenvolvimento cognitivo faz-se por mudanças de estruturas através de invariantes funcionais:

Assimilação à mecanismo pelo qual o indivíduo sobre influência do meio

Acomodação à movimento do organismo no sentido de se submeter às exigências exteriores, adequando-se ao meio

Equilibração à processo de regulação entre a assimilação e acomodação, através do qual uma nova aquisição se deve equilibrar com as anteriormente adquiridas.

FACTORES DE DESENVOLVIMENTO

Hereditariedade, a maturação interna dos sistemas nervosos e endócrino, bem como o crescimento orgânico têm um papel importante no processo de desenvolvimento. A estimulação do meio pode acelerar ou retardar o processo de maturação.

Experiência física, a acção exercida sobre os objectos desenvolve a motricidade da criança, propiciando o seu desenvolvimento intelectual.

Transmissão social, é também um factor importante. Integrada numa sociedade, a criança interage com o meio físico e social.

ESTÁDIOS DE DESENVOLVIMENTO

Os quatro estádios de desenvolvimento são estruturas de conjunto que têm a sua unidade funcional, o que vai permitir caracterizá-los.

Os estádios caracterizam-se por:
Uma estrutura com características próprias;
Uma ordem de sucessão constante;
Uma evolução integrativa, isto é, as novas aquisições são integrativas, isto é, as novas aquisições são integradas na estrutura anterior, organizando-se agora uma nova estrutura hierarquicamente superior.

Segundo Piaget, o desenvolvimento ocorre segundo quatro estádios:

Estádio Sensório-Motor (0-18/24 meses):
Dos reflexos inatos à construção da imagem mental, anterior à linguagem
Coordenação dos meios e fins
Permanência do objecto
Invenção de novos meios, imagem mental e formação de símbolos

· Estádio Pré-Operatório (2-7 anos):
o Inteligência representativa
o Egocentrismo – centração
o Pensamento mágico / animismo, realismo, finalismo

· Operações Concretas (7-11/12 anos):
o Reversibilidade mental
o Pensamento lógico, acção sobre o real
o Operações mentais: contar/medir/classificar/seriar
o Conservação da matéria sólida/líquida/peso/volume
o Conceitos de tempo, espaço, velocidade

· Operações Formais (11/12 – 15/16 anos):
o Pensamento abstracto
o Operar sobre operações, acção sobre o possível
o Raciocínios hipotético-dedutivos
o Definição de conceitos e valores
o Egocentrismo cognitivo

Psicologia do Desenvolvimento


A psicologia do desenvolvimento acompanhou a evolução da ciência e das transformações sócio-económicas, bem como das representações sociais do que é ser criança.

O CONCEITO DE DESENVOLVIMENTO

A situação contraditória – tens muito em comum com os outros, tens muito de diferente em relação aos outros – revela a complexidade do desenvolvimento.

No processo de desenvolvimento que se inicia na concepção e termina na morte, estão envolvidos múltiplos factores: biológicos, cognitivos, motores, emocionais, linguísticos, sociais…

Numa perspectiva dinâmica e abrangente, o ser humano terá que ser encarado como um sistema aberto, em que todos os aspectos interagem: o meio natural e a família, os amigos, o grupo de vizinhança, a escola, a comunidade.

Existem contextos que influenciam activamente os percursos da nossa vida: a mudança de terra/casa, doença, morte, divórcio…

Uma questão que se pode levantar é o problema da existência ou não de períodos críticos, isto é, de etapas limitadas de tempo durante as quais o organismo é sensível à estimulação do meio.

CONCEPÇÕES SOBRE O DESENVOLVIMENTO

Maturacionismo (Gesell) - os comportamentos sucedem-se numa ordem sequencial, inalterável, que reflecte uma programação interna idêntica ao crescimento. O desenvolvimento e a maturação são hereditários. As diferenças entre os indivíduos relacionam-se com as diferenças inatas. O meio e as experiências vivenciadas têm pouca importância.

Behaviorismo (Watson) - os factores do meio e da aprendizagem são os que determinam o comportamento.

Construtivismo (Piaget) e Teoria Psicossocial (Erikson) - valorizam os factores maturativos e socioculturais.

Psicanálise (Freud) - embora privilegie o potencial inato e maturativo, considera importante a forma como o sujeito vivencia os aspectos relacionais, sobretudo os desenvolvidos na infância.

A dinâmica entre o organismo e o meio é uma realidade – o indivíduo é uma unidade biopsicossocial.

Psicanálise


Sigmund Freud viveu entre 1855 e 1939. Licenciou-se em medicina na Universidade de Viena, com especialização em histologia e neurologia. Freud interessava-se por pesquisa científica e começou a trabalhar no laboratório do neurofisiologista, em Brucke. Mais tarde, Freud abandona o laboratório e começa a trabalhar no Hospital Geral de Viena, onde conhece Josef Breuer, um médico que fazia terapia a mulheres que sofriam de histeria. Por esta altura recebe uma bolsa de investigação para ir trabalhar com Charcot, psiquiatra no hospital Psiquiátrico de Salpétriêre, em França, no estudo da histeria e na utilização da hipnose (estado mental transitório, que se assemelha a um estado de sono e que é caracterizado pela ausência de reacção aos estímulos do meio ambiente e a uma ausência de iniciativa comportamental) para o seu tratamento. Durante este período, Freud assistiu a demonstrações feitas por Charcot que, através do hipnotismo, conseguia eliminar os sintomas neuróticos das pessoas que os possuíam, tais como: cegueira, paralisia, alucinações e perda de controle motor. Através da mesma técnica, conseguia também induzir os mesmos sintomas em pessoas que não sofriam deles.
Freud regressa ao Hospital Geral, agora já considerado como especialista em neuropatologia, e começa a colaborar com Breuer no tratamento da histeria, que incluía massagens, terapia de repouso e hipnose.
Em 1895 Josef Breuer e Sigmund Freud publicam o livro Estudos sobre a Histeria onde descrevem casos clínicos reais. Um dos casos é o de Cecily, uma jovem de 21 anos a quem os médicos apelidaram de “Anna O” e que começou a manifestar sintomas neuróticos após a morte do pai. Esta jovem apresentou inúmeros sintomas característicos da histeria.
Com a evolução de sua experiência clínica, Freud compreendeu que os sintomas neuróticos são provocados por experiências sexuais, que ocorreram na maior parte dos casos durante a infância e defendeu que a satisfação sexual era a chave para a felicidade e equilíbrio emocional.
Após a morte de Jacob, seu pai, Sigmund Freud fica bastante abalado e começa também a ter uns sonhos perturbadores que, aos poucos, tenta analisar e compreender a sua origem, interpretando-os como realizações disfarçadas de desejos inconscientes. Surge assim a técnica da interpretação dos sonhos. Freud lança também um livro intitulado A Interpretação dos Sonhos.
Breuer não concordou com Freud nestes novos aspectos acabando por não o acompanhar mais no seu trabalho.
Novas técnicas e novos conceitos foram introduzidos por Sigmund Freud que se tornou num dos maiores responsáveis, no século XX, por uma mudança radical nas mentalidades da época. Inconsciente, pulsão (força de base biológica e inata que está na origem de toda a dinâmica psicológica), líbido (é a energia derivada da pulsão sexual), mecanismos de defesa do ego (comportamentos que representam as negações inconscientes ou distorcidas da realidade e que são adoptados com a finalidade de proteger o ego contra a ansiedade), Complexo de Édipo (desejo da parte da criança de possuir sexualmente o elemento parental do sexo oposto, enquanto exclui o outro elemento do mesmo sexo), estádios de desenvolvimento psicossexuais, associações livres (método no qual o paciente é encorajado a dizer o que sente, sem qualquer tipo de censura), análise da transferência (atitudes emocionais desenvolvidas pelo paciente em relação ao analista) e dos actos falhados (lapsos de linguagem ou de memória), sexualidade infantil e interpretação dos sonhos são então as novidades que Freud propõe e que formam instrumentos da Psicanálise, que é simultâneamente uma teoria, um método e uma terapia.
Enquanto teoria a psicanálise tenta compreender a personalidade humana em toda a sua complexidade fornecendo-nos uma perspectiva dos diferentes aspectos que a caracterizam: o aspecto dinâmico das forças ou pulsões que a fazem mover e dos conflitos que se estabelecem; o aspecto tópico, as zonas e estruturas que caracterizam o seu funcionamento; o aspecto económico, que se ocupa da gestão e investimento das energia pulsionais; e o aspecto genético que identifica os grandes momentos e transformações através dos quais o indivíduo constrói e estrutura a sua personalidade. A psicanálise abordou todos estes novos modelos conceptuais de uma forma bastante inovadora para a época. Alguns foram pela primeira vez propostos por Freud, tais como a importância dos processos inconscientes, o papel da sexualidade e o relevo dado à infância na formação da personalidade. Segundo o fundador desta teoria, toda a dinâmica psicológica e afectiva tem por base tendências inatas, as pulsões ou instintos, nomeadamente sexuais, que conduzem o indivíduo para actividades que cabem com essa tensão, gerando prazer. A sexualidade a que Freud se refere é toda e qualquer forma de conseguir prazer, desde o chuchar no dedo até à realização do acto sexual. Partindo da sua prática clínica, Freud propõe um primeiro modelo de funcionamento do “aparelho psíquico” _ “1.ª tópica”_ dividindo-o em duas áreas: o inconsciente e o consciente ou pré - consciente. Estas duas áreas comunicam através da “censura” que tem o papel de manter no inconsciente os materiais (afectos, representações, vivências) que possam chocar o consciente, este processo é denominado por “recalcamento”. Porém esta visão do psiquismo humano era incompleta e Freud acabou por criar uma “2.ª tópica” que o dividia em três instâncias: o id (constituído pelas pulsões; funciona segundo o principio do prazer), o ego (que regula o conflito entre as pulsões e as exigências da realidade exterior, através dos “mecanismos de defesa”; funciona segundo o principio da realidade) e o superego (formado pela interiorização das proibições impostas pela realidade exterior). Para a psicanálise a personalidade humana constrói-se através de várias instâncias que a compõem e da diversidade das formas de realização das pulsões. Freud dividiu esse desenvolvimento em várias fases, sendo cada uma delas identificada pela zona do corpo que provoca satisfação da sua pulsão _ zona erógena _ , através da sua estimulação. No primeiro ano de vida a zona erógena situa-se na boca _ fase oral; aos dois e três anos é a região anal _ fase anal; entre os três e os cinco/ seis anos a zona erógena centra-se nos órgãos genitais mas indiferenciados e representados simbolicamente pelo pénis _ fase fálica, é no decurso desta fase que a criança experiência o complexo de Édipo e dá-se a estruturação do superego; entre os seis e os onze/ doze anos a actividade pulsional abranda e dá-se uma “amnésia infantil” na qual as experiências afectivas anteriores sofrem um processo de “recalcamento” _ período de latência; na puberdade a actividade das pulsões volta a estar mais activa e as zonas de prazer voltam a ser os órgãos sexuais, mas agora diferenciados _ fase genital. Cada fase superas as anteriores integrando-as e unificando-as sob o ponto de vista da satisfação, mas por vezes a passagem à fase seguinte pode ser dificultada por uma “fixação” (excessiva gratificação) ou por uma “regressão” (a formas de satisfação típicas de uma fase anterior).
Como método a psicanálise começou pelo uso da hipnose, mas mais tarde acaba por prescindir deste e passou a recorrer a outras técnicas como as associações livres de ideias e a interpretação dos sonhos.
A terapia psicanalista começou com o objectivo de tornar o indivíduo consciente da vivência inconsciente que provocava a perturbação neurótica, porém isto era isuficiente. Então, só através a revivência e resolução do conflito anteriormente mal resolvido, que são feitos por “transferência” para o psicanalista, é que a cura se pode dar.

Saúde Mental

Dia 10 de Outubro comemorou-se o Dia Mundial da Saúde Mental. A propósito dessa comemoração, aqui fica a legislação sobre esta matéria.


Lei de Saúde Mental
A Assembleia da República decreta, nos termos da alínea c) do artigo 161.°, das alíneas a) e b) do n.° l do artigo 165.° e do n.° 3 do artigo 166.° da Constituição, para valer como lei geral da República, o seguinte:

CAPÍTULO I



Disposições gerais
Artigo 1.°
Objectivos
A presente lei estabelece os princípios gerais da política de saúde mental e regula o internamento compulsivo: dos portadores de anomalia psíquica, designadamente das pessoas com doença mental.

Artigo 2.°
Protecção e promoção da saúde mental
A protecção da saúde mental efectiva-se através de medidas que contribuam para assegurar ou restabelecer o equilíbrio psíquico dos indivíduos, para favorecer o desenvolvimento das capacidades envolvidas na construção da personalidade e para promover a sua integração crítica no meio social em que vive.
As medidas referidas no número anterior incluem acções de prevenção primária, secundária e terciária da doença mental, bem como as que contribuam para a promoção da saúde mental das populações.

Artigo 3.°
Princípios gerais de política de saúde mental
1. Sem prejuízo do disposto na Lei de Bases da Saúde, devem observar-se os seguintes princípios gerais:
a) A prestação de cuidados de saúde mental é pro-movida prioritariamente a nível da comunidade, por forma a evitar o afastamento dos doentes do seu meio habitual e a facilitar a sua reabilitação e inserção social;
b) Os cuidados de saúde mental são prestados no meio menos restritivo possível;c) O tratamento de doentes mentais em regime de internamento ocorre, tendencialmente, em hospitais gerais;
d) No caso de doentes que fundamentalmente careçam de reabilitação psicossocial, a prestação de cuidados é assegurada, de preferência, em estruturas residenciais, centros de dia e unidades de treino e reinserção profissional, inseridos na comunidade e adaptados ao grau específico de autonomia dos doentes.
2. Nos casos previstos na alínea d) do número anterior, os encargos com os serviços prestados no âmbito da reabilitação e inserção social, apoio residencial e reinserção profissional são comparticipados em termos a definir pelos membros do Governo responsáveis pelas áreas da saúde, segurança social e emprego.
3. A prestação de cuidados de saúde mental é assegurada por equipas multidisciplinares habilitadas a responder, de forma coordenada, aos aspectos médicos, psicológicos, sociais, de enfermagem e de reabilitação.

Artigo 4.°
Conselho Nacional de Saúde Mental
O Conselho Nacional de Saúde Mental é o órgão de consulta do Governo em matéria de política de saúde mental, nele estando representadas as entidades interessadas no funcionamento do sistema de saúde mental, designadamente as associações de familiares e de utentes, os subsistemas de saúde, os profissionais de saúde mental e os departamentos governamentais com áreas de actuação conexas.
A composição, as competências e o funcionamento do Conselho Nacional de Saúde Mental constam de decreto-lei.

Artigo 5.°
Direitos e deveres do utente
1. Sem prejuízo do previsto na Lei de Bases da Saúde, o utente dos serviços de saúde mental tem ainda o direito de:
a) Ser informado, por forma adequada, dos seus direitos, bem como do plano terapêutico pro-posto e seus efeitos previsíveis;b) Receber tratamento e protecção, no respeito pela sua individualidade e dignidade;c) Decidir receber ou recusar as intervenções diagnosticas e terapêuticas propostas, salvo quando for caso de internamento compulsivo ou em situações de urgência em que a não intervenção criaria riscos comprovados para o próprio ou para terceiros;d) Não ser submetido a electroconvulsivoterapia sem o seu prévio consentimento escrito;e) Aceitar ou recusar, nos termos da legislação em vigor, a participação em investigações, ensaios clínicos ou actividades de formação;f) Usufruir de condições dignas de habitabilidade, higiene, alimentação, segurança, respeito e privacidade em serviços de internamento e estruturas residenciais;g) Comunicar com o exterior e ser visitado por familiares, amigos e representantes legais, com as limitações decorrentes do funcionamento dos serviços e da natureza da doença;h) Receber justa remuneração pelas actividades e pêlos serviços por ele prestados;i) Receber apoio no exercício dos direitos de reclamação e queixa.
2. A realização de intervenção psicocirúrgica exige, além do prévio consentimento escrito, o parecer escrito favorável de dois médicos psiquiatras designados pelo Conselho Nacional de Saúde Mental.
3. Os direitos referidos nas alíneas c), d) e e) do n.° l são exercidos pelos representantes legais quando os doentes sejam menores de 14 anos ou não possuam o discernimento necessário para avaliar o sentido e alcance do consentimento.

CAPÍTULO II

Do internamento compulsivo
SECÇÃO I

Disposições gerais

Artigo 6.°
Âmbito de aplicação
O presente capítulo regula o internamento compulsivo dos portadores de anomalia psíquica.
O internamento voluntário não fica sujeito ao disposto neste capítulo, salvo quando um internado voluntariamente num estabelecimento se encontre na situação prevista nos artigos 12.° e 22.°
Artigo 7.°
Definições
Para efeitos do disposto no presente capítulo, considera-se:
a) Internamento compulsivo: internamento por decisão judicial do portador de anomalia psíquica grave;b) Internamento voluntário: internamento a solicitação do portador de anomalia psíquica ou a solicitação do representante legal de menor de 14 anos;c) Internando: portador de anomalia psíquica submetido ao processo conducente às decisões previstas nos artigos 20.° e 27.°;d) Estabelecimento: hospital ou instituição análoga que permita o tratamento de portador de anomalia psíquica; e} Autoridades de saúde pública: as como tal qualificadas pela lei;f) Autoridades de polícia: os directores, oficiais, inspectores e subinspectores de polícia e todos os funcionários policiais a quem as leis respectivas reconhecerem aquela qualificação.
Artigo 8.°
Princípios gerais
O internamento compulsivo só pode ser determinado quando for a única forma de garantir a submissão a tratamento do internado e finda logo que cessem os fundamentos que lhe deram causa.
O internamento compulsivo só pode ser determinado se for proporcionado ao grau de perigo e ao bem jurídico em causa.
Sempre que possível o internamento é substituído por tratamento em regime ambulatório.
As restrições aos direitos fundamentais decorrentes do internamento compulsivo são as estritamente necessárias e adequadas à efectividade do tratamento e à segurança e normalidade do funcionamento do estabelecimento, nos termos do respectivo regulamento interno.
Artigo 9.°
Legislação subsidiária
Nos casos omissos aplica-se, devidamente adaptado, o disposto no Código de Processo Penal.

SECÇÃO II
Dos direitos e deveres

Artigo 10.°
Direitos e deveres processuais do internando
1. O internando goza, em especial, do direito de:
a) Ser informado dos direitos que lhe assistem;b) Estar presente aos actos processuais que directamente lhe disserem respeito, excepto se o seu estado de saúde o impedir;c) Ser ouvido pelo juiz sempre que possa ser tomada uma decisão que pessoalmente o afecte, excepto se o seu estado de saúde tomar a audição inútil ou inviável;d) Ser assistido por defensor, constituído ou nomeado, em todos os actos processuais em que participar e ainda nos actos processuais que directamente lhe disserem respeito e em que não esteja presente;e) Oferecer provas e requerer as diligências que se lhe afigurem necessárias.
2. Recai sobre o internando o especial dever de se submeter às medidas e diligências previstas nos artigos 17.°, 21.°, 23.°, 24.° e 27.°

Artigo 11 °

Direitos e deveres do internado
O internado mantém os direitos reconhecidos aos internados nos hospitais gerais.
O internado goza, em especial, do direito de:
a) Ser informado e, sempre que necessário, esclarecido sobre os direitos que lhe assistem;b) Ser esclarecido sobre os motivos da privação da liberdade;c) Ser assistido por defensor constituído ou nomeado, podendo comunicar em privado com este;d) Recorrer da decisão de internamento e da decisão que o mantenha;e) Votar, nos termos da lei;f) Enviar e receber correspondência;g) Comunicar com a comissão prevista no artigo 38.°
3. O internado tem o especial dever de se submeter aos tratamentos medicamente indicados, sem prejuízo do disposto no n.° 2 do artigo 5.°

SECÇÃO III
Internamento

Artigo 12.°
Pressupostos
O portador de anomalia psíquica grave que crie, por força dela, uma situação de perigo para bens jurídicos, de relevante valor, próprios ou alheios, de natureza pessoal ou patrimonial, e recuse submeter-se ao necessário tratamento médico pode ser internado em estabelecimento adequado.
Pode ainda ser internado o portador de anomalia psíquica grave que não possua o discernimento necessário para avaliar o sentido e alcance do consentimento, quando a ausência de tratamento deteriore de forma acentuada o seu estado.

Artigo 13.°

Legitimidade
Tem legitimidade para requerer o internamento compulsivo o representante legal do portador de anomalia psíquica, qualquer pessoa com legitimidade para requerer a sua interdição, as autoridades de saúde pública e o Ministério Público.
Sempre que algum médico verifique no exercício das suas funções uma anomalia psíquica com os efeitos previstos no artigo 12.° pode comunicá-la à autoridade de saúde pública competente para os efeitos do disposto no número anterior.
Se a verificação ocorrer no decurso de um internamento voluntário, tem também legitimidade para requerer o internamento compulsivo o director clínico do estabelecimento.

Artigo 14.°

Requerimento
O requerimento, dirigido ao tribunal competente, é formulado por escrito, sem quaisquer formalidades especiais, devendo conter a descrição dos factos que fundamentam a pretensão do requerente.
Sempre que possível, o requerimento deve ser instruído com elementos que possam, contribuir para a decisão do juiz, nomeadamente relatórios clínico-psi-quiátricos e psicossociais.

Artigo 15.°

Termos subsequentes
Recebido o requerimento, o juiz notifica o internando, informando-o dos direitos e deveres processuais que lhe assistem, e nomeia-lhe um defensor, cuja intervenção cessa se ele constituir mandatário.
O defensor e o familiar mais próximo do internando que com ele conviva ou a pessoa que com o internando viva em condições análogas às dos cônjuges são notificados para requerer o que tiverem por conveniente no prazo de cinco dias.
Para os mesmos efeitos, e em igual prazo, o pro-cesso vai com vista ao Ministério Público.

Artigo 16.°

Actos instrutórios
O juiz, oficiosamente ou a requerimento, determina a realização das diligências que se lhe afigurem necessárias e, obrigatoriamente, a avaliação clínico-psiquiátrica do internando, sendo este para o efeito notificado.
No caso previsto no n.° 3 do artigo 13.°, o juiz pode prescindir da avaliação referida no número anterior, designando de imediato data para a sessão conjunta nos termos do artigo 18.°

Artigo 17.°

Avaliação clínico-psiquiátrica
A avaliação clínico-psiquiátrica é deferida aos serviços oficiais de assistência psiquiátrica da área de residência do internando, devendo ser realizada por dois psiquiatras, no prazo de 15 dias, com a eventual colaboração de outros profissionais de saúde mental.
A avaliação referida no número anterior pode, excepcionalmente, ser deferida ao serviço de psiquiatria forense do instituto de medicina legal da respectiva circunscrição.
Sempre que seja previsível a não comparência do internando na data designada, o juiz ordena a emissão de mandado de condução para assegurar a presença daquele.
Os serviços remetem o relatório ao tribunal no prazo máximo de sete dias.
O juízo técnico-científíco inerente à avaliação clínico-psiquiátrica está subtraído à livre apreciação do juiz.

Artigo 18.°

Actos preparatórios da sessão conjunta
Recebido o relatório da avaliação clínico-psiquiátrica, o juiz designa data para a sessão conjunta, sendo notificados o internando, o defensor, o requerente e o Ministério Público.
O juiz pode convocar para a sessão quaisquer outras pessoas cuja audição reputar oportuna, designadamente o médico assistente, e determinar, oficiosamente ou a requerimento, que os psiquiatras prestem esclarecimentos complementares, devendo ser-lhes comunicado o dia, a hora e o local da realização da sessão conjunta.
Se houver discordância entre os psiquiatras, apresenta cada um o seu relatório, podendo o juiz determinar que seja renovada a avaliação clínico-psiquiátrica a cargo de outros psiquiatras, nos termos do artigo 17.°

Artigo 19.°

Sessão conjunta
Na sessão conjunta é obrigatória a presença do defensor do internando e do Ministério Público.
Ouvidas as pessoas convocadas, o juiz dá a palavra para alegações sumárias ao mandatário do requerente, se tiver sido constituído, ao Ministério Público e ao defensor e profere decisão de imediato ou no prazo máximo de cinco dias se o procedimento revestir complexidade.
Se o internando aceitar o internamento e não houver razões para duvidar da aceitação, o juiz providencia a apresentação deste no serviço oficial de saúde mental mais próximo e determina o arquivamento do processo.

Artigo 20.°

Decisão
A decisão sobre o internamento é sempre fundamentada.
A decisão de internamento identifica a pessoa a internar e especifica as razões clínicas, o diagnóstico clínico, quando existir, e a justificação do internamento.
A decisão é notificada ao Ministério Público, ao internando, ao defensor e ao requerente. A leitura da decisão, equivale à notificação dos presentes.

Artigo 21.°

Cumprimento da decisão de internamento
Na decisão de internamento o juiz determina a apresentação do internado no serviço oficial de saúde mental mais próximo, o qual providencia o internamento imediato.
O juiz emite mandado de condução com identificação da pessoa a internar, o qual é cumprido, sempre que possível, pelo serviço referido no número anterior, que, quando necessário, solicita a coadjuvação das forças policiais.
Não sendo possível o cumprimento nos termos do número anterior, o mandado de condução pode ser cumprido pelas forças policiais, que, quando necessário, solicitam o apoio dos serviços de saúde mental ou dos serviços locais de saúde.
Logo que determinado o local definitivo do internamento, que deverá situar-se o mais próximo possível da residência do internado, aquele é comunicado ao defensor do internado e ao familiar mais próximo que com ele conviva, à pessoa que com ele viva em condições análogas às dos cônjuges ou a pessoa de confiança do internado.

SECÇÃO IV

Internamento de urgência


Artigo 22.°

Pressupostos
O portador da anomalia psíquica pode ser internado compulsivamente de urgência, nos termos dos artigos seguintes, sempre que, verificando-se os pressupostos do artigo 12.°, n.° l, exista perigo iminente para os bens jurídicos aí referidos, nomeadamente por deterioração aguda do seu estado.

Artigo 23.°
Condução do internando
Verificados os pressupostos do artigo anterior, as autoridades de polícia ou de saúde pública podem determinar, oficiosamente ou a requerimento, através de mandado, que o portador de anomalia psíquica seja conduzido ao estabelecimento referido no artigo seguinte.
O mandado é cumprido pelas forças policiais, com o acompanhamento, sempre que possível, dos serviços do estabelecimento referido no artigo seguinte.O mandado contém.,a assinatura da/autoridade competente, a identificação da pessoa a conduzir e a indicação das razões que o fundamentam.
Quando, pela situação de urgência e de perigo na demora, não seja possível a emissão prévia de mandado, qualquer agente policial procede à condução imediata do internando.
Na situação descrita no número anterior o agente policial lavra auto em que discrimina os factos, bem como as circunstâncias de tempo e de lugar em que a mesma foi efectuada.
A condução é comunicada de imediato ao Ministério Público com competência na área em que aquela se iniciou.

Artigo 24.°

Apresentação do internando
O internando é apresentado de imediato no estabelecimento com urgência psiquiátrica mais próximo do local em que se iniciou a condução, onde é submetido a avaliação clínico-psiquiátrica com registo clínico e lhe é prestada a assistência médica necessária.

Artigo 25.°

Termos subsequentes
Quando da avaliação clínico-psiquiátrica se concluir pela necessidade de internamento e o internando a ele se opuser, o estabelecimento comunica, de imediato, ao tribunal judicial com competência na área a admissão daquele, com cópia do mandado e do relatório da avaliação.
Quando a avaliação clínico-psiquiátrica não confirmar a necessidade de internamento, a entidade que tiver apresentado o portador de anomalia psíquica restitui-o de imediato à liberdade, remetendo o expediente ao Ministério Público com competência na área em que se iniciou a condução.
O disposto no n.° l é aplicável quando na urgência psiquiátrica ou no decurso de internamento voluntário se verifique a existência da situação descrita no artigo 22.°

Artigo 26.°
Confirmação judicial
Recebida a comunicação referida no n.° l do artigo anterior, o juiz nomeia defensor ao internando e dá vista nos autos ao Ministério Público.
Realizadas as diligências que reputar necessárias, o juiz profere decisão de manutenção ou não do internamento, no prazo máximo de quarenta e oito horas a contar da privação da liberdade nos termos dos artigos 23.° e 25.°, n.° 3.
A decisão de manutenção do internamento é comunicada, com todos os elementos que a fundamentam, ao tribunal competente.
A decisão é comunicada ao internando e ao familiar mais próximo que com ele conviva ou à pessoa que com o internando viva em condições análogas às dos cônjuges, bem como ao médico assistente, sendo aquele informado, sempre que possível, dos direitos e deveres processuais que lhe assistem.

Artigo 27.°
Decisão final
Recebida a comunicação a que se refere o n.° 3 do artigo anterior, o juiz dá início ao processo de internamento compulsivo com os fundamentos previstos no artigo 12.°, ordenando para o efeito que, no prazo de cinco dias, tenha lugar nova avaliação clínico-psiquiátrica, a cargo de dois psiquiatras que não tenham pro-cedido à anterior, com a eventual colaboração de outros profissionais de saúde mental.
É ainda correspondentemente aplicável o disposto no artigo 15.°
Recebido o relatório da avaliação clínico-psiquiátrica e realizadas as demais diligências necessárias, é designada data para a sessão conjunta, à qual é correspondentemente aplicável o disposto nos artigos 18.°,19.°, 20.° e 21.°, n.° 4.

SECCÇÃO V
Casos especiais

Artigo 28.°

Pendência de processo penal
A pendência de processo penal em que seja arguido portador de anomalia psíquica não obsta a que o tribunal competente decida sobre o internamento nos termos deste diploma.
Em caso de internamento, o estabelecimento remete ao tribunal onde pende o processo penal, de dois em dois meses, informação sobre a evolução do estado do portador de anomalia psíquica.

Artigo 29.°
Internamento compulsivo de inimputável
O tribunal que não aplicar a medida de segurança prevista no artigo 91.° do Código Penal pode decidir o internamento compulsivo do inimputável.
Sempre que seja imposto o internamento é remetida certidão da decisão ao tribunal competente para os efeitos do disposto nos artigos 33.°, 34.° e 35.°

SECÇÃO VI

Disposições comuns

Artigo 30.°

Regras de competência
Para efeitos do disposto no presente capítulo, tribunal competente é o tribunal judicial de competência genérica da área de residência do internando.
Se na comarca da área de residência do internando existir tribunal judicial de competência especializada em matéria criminal, a competência é atribuída a este.

Artigo 31.°

Habeas corpus em virtude de privação da liberdade ilegal
1. O portador de anomalia psíquica privado da liberdade, ou qualquer cidadão no gozo dos seus direitos políticos, pode requerer ao tribunal da área onde o portador se encontrar a imediata libertação com algum dos seguintes fundamentos:
a) Estar excedido o prazo previsto no artigo 26.°, n.°2;b) Ter sido a privação da liberdade efectuada ou ordenada por entidade incompetente;c) Ser a privação da liberdade motivada fora dos casos ou condições previstas nesta lei.
2. Recebido o requerimento, o juiz, se o não considerar manifestamente infundado, ordena, se necessário por via telefónica, a apresentação imediata do portador da anomalia psíquica. 3. Juntamente com a ordem referida no número anterior, o juiz manda notificar a entidade que tiver o portador da anomalia psíquica à sua guarda, ou quem puder representá-la, para se apresentar no mesmo acto munida das informações e esclarecimentos necessários à decisão sobre o requerimento.4. O juiz decide, ouvidos o Ministério Público e o defensor constituído ou nomeado para o efeito.

Artigo 32.°
Recorribilidade da decisão
Sem prejuízo do disposto no artigo anterior, da decisão tomada nos termos dos artigos 20.°, 26.°, n.° 2, 27.°, n.° 3, e 35.° cabe recurso para o Tribunal da Relação competente.
Tem legitimidade para recorrer o internado, o seu defensor, quem requerer o internamento nos termos do artigo 13.°, n.° l, e o Ministério Público.
Todos os recursos previstos no presente capítulo têm efeito meramente devolutivo.

Artigo 33.°

Substituição do internamento
O internamento é substituído por tratamento compulsivo em regime ambulatório sempre que seja possível manter esse tratamento em liberdade, sem prejuízo do disposto nos artigos 34.° e 35.°
A substituição depende de expressa aceitação, por parte do internado, das condições fixadas pelo psiquiatra assistente para o tratamento em regime ambulatório.
A substituição é comunicada ao tribunal competente.
Sempre que o portador dá anomalia psíquica deixe de cumprir as condições estabelecidas, o psiquiatra assistente comunica o incumprimento ao tribunal competente, retomando-se o internamento.
Sempre que necessário, o estabelecimento solicita ao tribunal competente a emissão de mandados de condução a cumprir pelas forças policiais.

Artigo 34.°

Cessação do internamento
O internamento finda quando cessarem os pressupostos que lhe deram origem.
A cessação ocorre por alta dada pelo director clínico do estabelecimento, fundamentada em relatório de avaliação clínico-psiquiátrica do serviço de saúde onde decorreu o internamento, ou por decisão judicial.
A alta é imediatamente comunicada ao tribunal competente.

Artigo 35.°

Revisão da situação do internado
Se for invocada a existência de causa justificativa da cessação do internamento, o tribunal competente aprecia a questão a todo o tempo.
A revisão é obrigatória, independentemente de requerimento, decorridos dois meses sobre o início do internamento ou sobre a decisão que o tiver mantido.
Tem legitimidade para requerer a revisão o inter-nado, o seu defensor e as pessoas referidas no artigo 13.°, n.° 1.
Para o efeito do disposto no n.° 2 o estabelecimento envia, até 10 dias antes da data calculada para a revisão, um relatório de avaliação clínico-psiquiátrica elaborado por dois psiquiatras, com a eventual colaboração de outros profissionais de saúde mental.
A revisão obrigatória tem lugar com audição do Ministério Público, do defensor e do internado, excepto se o estado de saúde deste tornar a audição inútil ou inviável.

SECÇÃO VII

Da natureza e das custas do processo

Artigo 36.°

Natureza do processo
Os processos previstos no presente capítulo têm natureza secreta e urgente.

Artigo 37.°

CustasOs processos previstos neste capítulo são isentos de custas.

SECÇÃO VIII

Comissão de acompanhamento


Artigo 38.°

Criação e atribuições
É criada uma comissão para acompanhamento da execução do disposto no presente capítulo, seguidamente designada por «comissão».

Artigo 39.°

Sede e serviços administrativos
Por despacho conjunto dos Ministros da Justiça e da Saúde são definidos os serviços de apoio técnico e administrativo à actividade da comissão, bem como a respectiva sede.

Artigo 40.°

Composição
A comissão é constituída por psiquiatras, juristas, por um representante das associações de familiares e utentes de saúde mental e outros técnicos de saúde mental, nomeados por despacho conjunto dos Ministros da Justiça e da Saúde.

Artigo 41.°

Competências
Incumbe especialmente à comissão:
a) Visitar os estabelecimentos e comunicar directamente com os internados;b) Solicitar ou remeter a quaisquer entidades (administrativas ou judiciárias informações sobre a situação dos internados;c) Receber e apreciar as reclamações dos inter-nados ou das pessoas com legitimidade para requerer o internamento sobre as condições do mesmo;d) Solicitar ao Ministério Público junto do tribunal competente os procedimentos judiciais julgados adequados à correcção de quaisquer situações de violação da lei que verifique no exercício das suas funções;e) Recolher e tratar a informação relativa à aplicação do presente capítulo;f) Propor ao Governo as medidas que julgue necessárias à execução da presente lei.

Artigo 42.°

Cooperação
Para os fins previstos na alínea e) do artigo anterior, os tribunais remetem à comissão cópia das decisões previstas no presente capítulo.
E dever das entidades públicas e privadas dispensar à comissão toda a colaboração necessária ao exercício da sua competência.

Artigo 43.°

Base de dados
A comissão promoverá, nos termos e condições previstos na legislação sobre protecção de dados pessoais e sobre o sigilo médico, a organização de uma base de dados informática relativa à aplicação do presente capítulo, a que terão acesso entidades públicas ou privadas que nisso tenham interesse legítimo.

Artigo 44.°

Relatório
A comissão apresenta todos os anos ao Governo, até 31 de Março do ano seguinte, um relatório sobre o exercício das suas atribuições e a execução do disposto no presente capítulo.

CAPÍTULO III

Disposições transitórias e finais


SECÇÃO I

Disposições transitórias


Artigo 45.°

Disposições transitórias
Os processos instaurados à data da entrada em vigor do presente diploma continuam a ser regulados pela Lei n.° 2118. de 3 de Abril de 1963, até à decisão que aplique o internamento.
Os estabelecimentos hospitalares que tenham doentes internados compulsivamente ao abrigo da lei referida no número anterior, no prazo de dois meses após a entrada em vigor da presente lei, comunicam 10 tribunal competente a situação clínica desses doentes os fundamentos do respectivo internamento e identificam o processo onde tenha sido proferida a decisão que o determinou.
Quando a decisão de internamento seja proferida pós a entrada em vigor da presente lei, o prazo referido o número anterior conta-se após o início da execução a decisão que tenha determinado o internamento.
O tribunal solicita à entidade que determinou o internamento o processo em que a decisão foi pro-ferida e, uma vez recebido, dá cumprimento ao disposto no artigo 35.° da presente lei.

SECÇÃO II

Disposições finais

Artigo 46.°

Gestão do património dos doentes
A gestão do património dos doentes mentais não declarados incapazes é regulada por decreto-lei.

Artigo 47.°

Serviços de saúde mental
A organização dos serviços de saúde mental é regulada por decreto-lei.

Artigo 48.°

Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor seis meses após a sua publicação.

Artigo 49.°

Revogação
É revogada a Lei n.° 2118, de 3 de Abril de 1963.

Aprovada em 18 de Junho de 1998.

O Presidente da Assembleia da República, António de Almeida Santos.Promulgada em 8 de Julho de 1998.Publique-se.O Presidente da República, JORGE SAMPAIO.Referendada em 14 de Julho de 1998.O Primeiro-Ministro, António Manuel de Oliveira Guterres.

Anorexia Nervosa

Ironicamente, num mundo preocupado com o avanço da obesidade, algumas pessoas sofrem de um problema que as torna muito magras: a Anorexia Nervosa.

A Anorexia Nervosa é um distúrbio caracterizado por uma visão distorcida do próprio corpo. A pessoa torna-se excessivamente magra, esquelética, mas ainda assim acredita que está gorda. Para evitar o ganho de peso ou para continuar perdendo peso, as pessoas afectadas pela anorexia podem tomar medidas drásticas, colocando a própria saúde em risco.





Considerando que actualmente a sociedade valoriza tanto a magreza, o ideal de moda e beleza acabam por conduzir muitas (e muitos) jovens a comportamentos como estes, em busca dum limiar de magreza impossível de alcançar.





Características Diagnósticas



As características essenciais da Anorexia Nervosa são a recusa do indivíduo a manter um peso corporal na faixa normal mínima, um temor intenso de ganhar peso e uma perturbação significativa na percepção da forma ou tamanho do corpo. Além disso, as mulheres pós-menarca com este transtorno são amenorreicas (o termo anorexia é uma designação incorrecta, uma vez que a perda do apetite é rara).O indivíduo mantém um peso corporal abaixo de um nível normal mínimo para sua idade e altura (Critério A). Quando a Anorexia Nervosa se desenvolve em um indivíduo durante a infância ou início da adolescência, pode haver fracasso em fazer os ganhos de peso esperados (isto é, enquanto ganha altura), ao invés de uma perda de peso.

O Critério A oferece uma orientação para determinar quando um indivíduo alcança o limiar para um peso abaixo do esperado. Ele sugere que o indivíduo pese menos que 85% do peso considerado normal para sua idade e altura (geralmente computado pelo uso de uma dentre as diversas versões publicadas das tabelas do Metropolitan Life Insurance ou de acordo com tabelas de crescimento usadas em pediatria). Uma orientação alternativa e algo mais rígida (usada nos Critérios de Diagnóstico para Pesquisas da CID-10) exige que o indivíduo tenha um índice de massa corporal (IMC) (calculado como peso em quilogramas/[altura em metros]2) igual ou inferior a 17,5 kg/m².Esses recursos são oferecidos apenas como directrizes sugeridas para o clínico, pois não é razoável especificar um único padrão para um peso normal mínimo, que se aplique a todos os indivíduos de determinada idade e altura. Ao determinar um peso normal mínimo, o clínico deve considerar não apenas essas directrizes, como também a constituição corporal e a história ponderal do indivíduo.A perda de peso em geral é obtida, principalmente, através da redução do consumo alimentar total. Embora os indivíduos possam começar excluindo de sua dieta aquilo que percebem como sendo alimentos altamente calóricos, a maioria termina com uma dieta muito restrita, por vezes limitada a apenas alguns alimentos. Métodos adicionais de perda de peso incluem purgação (isto é, auto-indução de vómito ou uso indevido de laxantes ou diuréticos) e exercícios intensos ou excessivos.Os indivíduos com este transtorno têm muito medo de ganhar peso ou ficar gordos (Critério B). Este medo intenso de engordar geralmente não é aliviado pela perda de peso. Na verdade, a preocupação com o ganho ponderal frequentemente aumenta à medida que o peso real diminui.A vivência e a importância do peso e da forma corporal são distorcidas nesses indivíduos (Critério C). Alguns indivíduos acham que têm um excesso de peso global. Outros percebem que estão magros, mas ainda assim se preocupam com o fato de certas partes de seu corpo, particularmente abdómen, nádegas e coxas, estarem "muito gordas". Eles podem empregar uma ampla variedade de técnicas para estimar seu peso, incluindo pesagens excessivas, medições obsessivas de partes do corpo e uso persistente de um espelho para a verificação das áreas percebidas como "gordas". A auto-estima dos indivíduos com Anorexia Nervosa depende em alto grau de sua forma e peso corporais. A perda de peso é vista como uma conquista notável e como um sinal de extraordinária autodisciplina, ao passo que o ganho de peso é percebido como um inaceitável fracasso do autocontrole. Embora alguns indivíduos com este transtorno possam reconhecer que estão magros, eles tipicamente negam as sérias implicações de seu estado de desnutrição.Em mulheres pós-menarca, a amenorreia (devido a níveis anormalmente baixos de secreção de estrógenos que, por sua vez, devem-se a uma redução da secreção de hormona folículo-estimulante [FSH] e hormona luteinizante [LH] pela pituitária) é um indicador de disfunção fisiológica na Anorexia Nervosa (Critério D). A amenorreia em geral é uma consequência da perda de peso mas, em uma minoria dos indivíduos, pode na verdade precedê-la. Em mulheres pré-púberes, a menarca pode ser retardada pela doença.O indivíduo frequentemente é levado à atenção profissional por membros da família, após a ocorrência de uma acentuada perda de peso (ou fracasso em fazer os ganhos de peso esperados). Quando o indivíduo busca auxílio por conta própria, isto geralmente ocorre em razão do sofrimento subjectivo acerca das sequelas somáticas e psicológicas da inanição. Raramente um indivíduo com Anorexia Nervosa se queixa da perda de peso em si. Essas pessoas frequentemente não possuem insight para o problema ou apresentam uma considerável negação quanto a este, podendo não ser boas fontes de sua história. Portanto, com frequência se torna necessário obter informações a partir dos pais ou outras fontes externas, para determinar o grau de perda de peso e outros aspectos da doença.

Subtipos

Os seguintes subtipos podem ser usados para a especificação da presença ou ausência de compulsões periódicas ou purgações regulares durante o episódio actual de Anorexia Nervosa.

Tipo Restritivo. Este subtipo descreve apresentações nas quais a perda de peso é conseguida principalmente através de dietas, jejuns ou exercícios excessivos. Durante o episódio actual, esses indivíduos não se envolveram com regularidades em compulsões periódicas ou purgações.

Tipo Compulsão Periódica/Purgativo. Este subtipo é usado quando o indivíduo se envolveu regularmente em compulsões periódicas ou purgações (ou ambas) durante o episódio actual. A maioria dos indivíduos com Anorexia Nervosa que comem compulsivamente também fazem purgações mediante vómitos auto-induzidos ou uso indevido de laxantes, diuréticos ou enemas. Alguns indivíduos incluídos neste subtipo não comem de forma compulsiva, mas fazem purgações regularmente após o consumo de pequenas quantidades de alimentos.

Aparentemente, a maior parte dos indivíduos com o Tipo Compulsão Periódica/Purgativo dedica-se a esses comportamentos pelo menos 1 vez por semana, mas não há informações suficientes que justifiquem a especificação de uma frequência mínima.Características e Transtornos AssociadosCaracterísticas descritivas e transtornos mentais associados. Quando seriamente abaixo do peso, muitos indivíduos com Anorexia Nervosa manifestam sintomas depressivos, tais como humor deprimido, retraimento social, irritabilidade, insónia e interesse diminuído por sexo. Esses indivíduos podem ter apresentações sintomáticas que satisfazem os critérios para Transtorno Depressivo Maior. Uma vez que esses aspectos também são observados em indivíduos sem Anorexia Nervosa que estão restringindo severamente sua alimentação, muitos dos aspectos depressivos podem ser secundários às sequelas fisiológicas da semi-inanição. Os sintomas de perturbação do humor devem, portanto, ser reavaliados após uma recuperação completa ou parcial do peso. Características obsessivo-compulsivas, tanto relacionadas quanto não relacionadas com comida, com frequência são proeminentes. A maioria dos indivíduos com Anorexia Nervosa preocupa-se excessivamente com alimentos. Alguns coleccionam receitas ou armazenam comida. Observações de comportamentos associados com outras formas de restrição alimentar sugerem que as obsessões e compulsões relacionadas a alimentos podem ser causadas ou exacerbadas pela desnutrição. Quando os indivíduos com Anorexia Nervosa apresentam obsessões e compulsões não relacionadas a alimentos, forma corporal ou peso, um diagnóstico adicional de Transtorno Obsessivo-Compulsivo pode ser indicado.Outras características ocasionalmente associadas com a Anorexia Nervosa incluem preocupações acerca de comer em público, sentimento de inutilidade, uma forte necessidade de controlar o próprio ambiente, pensamento inflexível, espontaneidade social limitada e iniciativa e expressão emocional demasiadamente refreadas.Comparados com indivíduos com Anorexia Nervosa, Tipo Restritivo, aqueles com o Tipo Compulsão Periódica / Purgativo estão mais propensos a ter outros problemas de controle dos impulsos, a abusarem de álcool ou outras drogas, a exibirem maior instabilidade do humor e a serem sexualmente activos.Achados laboratoriais associados. Embora alguns indivíduos com Anorexia Nervosa não apresentem anormalidades laboratoriais, a característica de semi-inanição deste transtorno pode afectar sistemas orgânicos importantes e produzir uma variedade de distúrbios. A indução de vómitos e o abuso de laxantes, diuréticos e enemas podem também causar diversos distúrbios, produzindo achados laboratoriais anormais. Hematologia: Leucopenia e leve anemia são comuns; trombocitopenia ocorre raramente.Química: A desidratação pode ser reflectida por um elevado nível de ureia sanguínea. Hipercolesterolemia é comum. Os testes de função hepática podem estar elevados. Hipomagnesemia, hipozinquemia, hipofosfatemia e hiperamilasemia são encontradas ocasionalmente. A indução de vómitos pode provocar alcalose metabólica (elevado bicarbonato sérico), hipocloremia e hipocalemia, e o abuso de laxantes pode causar acidose metabólica. Os níveis de iroxina sérica (T4) estão diminuídos. Hiperadrenocorticismo e resposta anormal a uma variedade de provocações neuroendócrinas são comuns. Em mulheres, baixos níveis de estrógeno sérico estão presentes, enquanto os homens têm baixos níveis de testosterona sérica. Existe uma regressão do eixo hipotalâmico-pituitário-gonadal em ambos os sexos, no sentido de que o padrão de secreção de hormônio luteinizante (LH) em 24 horas assemelha-se àquele normalmente visto em indivíduos pré-púberes ou na puberdade.Eletrocardiografia: São observadas bradicardia sinusal e, raramente, arritmias.Eletroencefalografia: Anormalidades difusas, refletindo uma encefalopatia metabólica, podem decorrer de distúrbios hidroeletrolíticos significativos.Imagens cerebrais: Um aumento na razão ventricular-cerebral secundária à privação alimentar é vista com frequência.Dispêndio de energia em repouso: Frequentemente está reduzido.Achados ao exame físico e condições médicas gerais associadasMuitos dos sinais e sintomas físicos da Anorexia Nervosa são atribuíveis à inanição. Além da amenorreia, pode haver queixas de constipação, dor abdominal, intolerância ao frio, letargia e excesso de energia. O achado que mais chama a atenção no exame físico é a aparência emaciada. Também pode haver hipotensão significativa, hipotermia e pele seca. Alguns indivíduos desenvolvem lanugo (pêlos finos) no tronco. A maioria dos indivíduos com Anorexia Nervosa apresenta bradicardia. Alguns desenvolvem edema periférico, especialmente durante a restauração do peso ou na cessação do abuso de laxantes e diuréticos. Raramente, petéquias, em geral nas extremidades, podem indicar uma diátese hemorrágica. Alguns indivíduos evidenciam um amarelamento da pele, associado com hipercarotenemia. A hipertrofia das glândulas salivares, particularmente das glândulas parótidas, pode estar presente. Os indivíduos que induzem vómito podem ter erosão do esmalte dentário e alguns têm cicatrizes ou calos no dorso das mãos, causados pelo contacto com os dentes quando utilizam as mãos para induzir o vómito. A inanição da Anorexia Nervosa e os comportamentos purgativos às vezes associados a ela acarretam condições médicas gerais significativas. Estas incluem o desenvolvimento de anemia normocítica normocrômica, prejuízo da função renal (associado com desidratação crónica e hipocalemia), problemas cardiovasculares (hipotensão severa, arritmias), problemas dentários e osteoporose (consequência do baixo consumo e absorção de cálcio, secreção reduzida de estrógeno e maior secreção de cortisol).





Características Específicas à Cultura, à Idade e ao Género



A Anorexia Nervosa parece ter uma prevalência bem maior em sociedades industrializadas, nas quais existe abundância de alimentos e onde, especialmente no tocante às mulheres, ser atraente está ligado à magreza. O transtorno é provavelmente mais comum nos Estados Unidos, Canadá, Austrália, Japão e África do Sul, mas poucos trabalhos sistemáticos examinaram a prevalência em outras culturas. Os indivíduos que emigraram de culturas nas quais o transtorno é raro para culturas nas quais o transtorno é mais prevalente podem desenvolver Anorexia Nervosa, à medida que assimilam os ideais de elegância ligados à magreza. Factores culturais também podem influenciar as manifestações do transtorno. Por exemplo, em algumas culturas, a percepção distorcida do corpo pode não ser proeminente, podendo a motivação expressada para a restrição alimentar ter um conteúdo diferente, como desconforto epigástrico ou antipatia por certos alimentos. A Anorexia Nervosa raramente inicia antes da puberdade, mas existem indícios de que a gravidade das perturbações mentais associadas pode ser maior entre os indivíduos pré-púberes que desenvolvem a doença. Entretanto, também há dados que sugerem que quando a doença inicia durante os primeiros anos da adolescência (entre 13 e 18 anos de idade), ela pode estar associada com um melhor prognóstico. Mais de 90% dos casos de Anorexia Nervosa ocorrem em mulheres.


Prevalência

Estudos sobre a prevalência entre mulheres na adolescência tardia e início da idade adulta verificam taxas de 0,5 a 1,0%, para apresentações que satisfazem todos os critérios para Anorexia Nervosa. Indivíduos que não atingem o limiar para o transtorno (isto é, com Transtorno Alimentar Sem Outra Especificação) são encontrados com maior frequência.Existem dados limitados envolvendo a prevalência deste transtorno em homens. A incidência de Anorexia Nervosa parece ter aumentado nas últimas décadas.CursoA idade média para o início da Anorexia Nervosa é de 17 anos, com alguns dados sugerindo picos bimodais aos 14 e aos 18 anos. O início do transtorno raramente ocorre em mulheres com mais de 40 anos. O aparecimento da doença frequentemente está associado com um acontecimento vital estressante, como sair de casa para cursar a universidade. O curso e o resultado da Anorexia Nervosa são altamente variáveis. Alguns indivíduos com Anorexia Nervosa se recuperam completamente após um episódio isolado, alguns exibem um padrão flutuante de ganho de peso seguido de recaída, e outros vivenciam um curso crónico e deteriorante ao longo de muitos anos. A hospitalização pode ser necessária para a restauração do peso e para a correcção de desequilíbrios hidroeletrolíticos. Dos indivíduos baixados em hospitais universitários, a mortalidade a longo prazo por Anorexia Nervosa é de mais de 10%. A morte ocorre, com maior frequência, por inanição, suicídio ou desequilíbrio eletrolítico.Padrão FamilialExiste um risco aumentado de Anorexia Nervosa entre os parentes biológicos em primeiro grau de indivíduos com o transtorno. Um risco maior de Transtornos do Humor também foi constatado entre os parentes biológicos em primeiro grau de indivíduos com Anorexia Nervosa, particularmente parentes de indivíduos com o Tipo Compulsão Periódica/Purgativo. Os estudos de Anorexia Nervosa em gémeos descobriram taxas de concordância para gémeos monozigóticos significativamente maiores do que para gémeos dizigóticos.Diagnóstico DiferencialOutras possíveis causas de perda significativa de peso devem ser consideradas no diagnóstico diferencial de Anorexia Nervosa, especialmente quando as características apresentadas são atípicas (tais como início da doença após os 40 anos). Em condições médicas gerais (por ex., doença gastrintestinal, tumores cerebrais, condições malignas ocultas e síndrome de imunodeficiência adquirida [AIDS]) pode ocorrer séria perda de peso, mas os indivíduos com esses transtornos em geral não têm uma imagem distorcida de seus corpos e um desejo de perder ainda mais peso. A síndrome da artéria mesentérica superior (caracterizada por vómitos pós-prandiais secundários à obstrução intermitente da saída gástrica) deve ser diferenciada da Anorexia Nervosa, embora esta síndrome possa ocasionalmente se desenvolver em indivíduos com Anorexia Nervosa, em razão de seu estado emaciado. No Transtorno Depressivo Maior pode ocorrer uma severa perda de peso, mas a maioria dos indivíduos com Transtorno Depressivo Maior não tem um desejo excessivo de perder peso ou um medo excessivo de ganhar peso. Na Esquizofrenia, os indivíduos podem apresentar um comportamento alimentar incomum e ocasionalmente experimentar uma perda de peso significativa, mas raramente demonstram o medo de ganhar peso e a perturbação da imagem corporal, necessários para um diagnóstico de Anorexia Nervosa. Algumas das características da Anorexia Nervosa fazem parte dos conjuntos de critérios para Fobia Social, Transtorno Obsessivo-Compulsivo e Transtorno Dismórfico Corporal. Especificamente, os indivíduos podem sentir-se humilhados ou embaraçados por serem vistos comendo em público, como na Fobia Social; podem apresentar obsessões e compulsões relacionadas a alimentos, como no Transtorno Obsessivo-Compulsivo, ou preocupar-se com um defeito imaginário em sua aparência física, como no Transtorno Dismórfico Corporal. Se os temores de um indivíduo com Anorexia Nervosa se restringem unicamente ao comportamento alimentar, o diagnóstico de Fobia Social não deve ser feito, mas os temores sociais que não têm relação com o comportamento alimentar (por ex., medo excessivo de falar em público) podem justificar um diagnóstico adicional de Fobia Social. Da mesma forma, um diagnóstico adicional de Transtorno Obsessivo-Compulsivo deve ser considerado apenas se o indivíduo apresenta obsessões e compulsões não relacionadas a alimentos (por ex., um medo excessivo de contaminação) e um diagnóstico adicional de Transtorno Dismórfico Corporal deve ser considerado apenas se a distorção não está relacionada à forma e ao tamanho do corpo (por ex., preocupação de que seu nariz seja grande demais).Na Bulimia Nervosa, os indivíduos apresentam episódios recorrentes de comer compulsivo, envolvem-se em comportamentos inadequados para evitarem ganhar peso (por ex., vómito auto-induzido) e preocupam-se excessivamente com a forma e o peso do corpo. Entretanto, à diferença dos indivíduos com Anorexia Nervosa, Tipo Compulsão Periódica/Purgativo, os indivíduos com Bulimia Nervosa são capazes de manter um peso corporal no nível normal mínimo ou acima deste.

Características Diagnósticas

As características essenciais da Anorexia Nervosa são a recusa do indivíduo a manter um peso corporal na faixa normal mínima, um temor intenso de ganhar peso e uma perturbação significativa na percepção da forma ou tamanho do corpo. Além disso, as mulheres pós-menarca com este transtorno são amenorréicas (o termo anorexia é uma designação incorrecta, uma vez que a perda do apetite é rara).O indivíduo mantém um peso corporal abaixo de um nível normal mínimo para sua idade e altura (Critério A). Quando a Anorexia Nervosa se desenvolve em um indivíduo durante a infância ou início da adolescência, pode haver fracasso em fazer os ganhos de peso esperados (isto é, enquanto ganha altura), ao invés de uma perda de peso. O Critério A oferece uma orientação para determinar quando um indivíduo alcança o limiar para um peso abaixo do esperado. Ele sugere que o indivíduo pese menos que 85% do peso considerado normal para sua idade e altura (geralmente computado pelo uso de uma dentre as diversas versões publicadas das tabelas do Metropolitan Life Insurance ou de acordo com tabelas de crescimento usadas em pediatria). Uma orientação alternativa e algo mais rígida (usada nos Critérios de Diagnóstico para Pesquisas da CID-10) exige que o indivíduo tenha um índice de massa corporal (IMC) (calculado como peso em quilogramas/[altura em metros]2) igual ou inferior a 17,5 kg/m².Esses recursos são oferecidos apenas como directrizes sugeridas para o clínico, pois não é razoável especificar um único padrão para um peso normal mínimo, que se aplique a todos os indivíduos de determinada idade e altura. Ao determinar um peso normal mínimo, o clínico deve considerar não apenas essas directrizes, como também a constituição corporal e a história ponderal do indivíduo. A perda de peso em geral é obtida, principalmente, através da redução do consumo alimentar total. Embora os indivíduos possam começar excluindo de sua dieta aquilo que percebem como sendo alimentos altamente calóricos, a maioria termina com uma dieta muito restrita, por vezes limitada a apenas alguns alimentos. Métodos adicionais de perda de peso incluem purgação (isto é, auto-indução de vómito ou uso indevido de laxantes ou diuréticos) e exercícios intensos ou excessivos. Os indivíduos com este transtorno têm muito medo de ganhar peso ou ficar gordos (Critério B). Este medo intenso de engordar geralmente não é aliviado pela perda de peso. Na verdade, a preocupação com o ganho ponderal frequentemente aumenta à medida que o peso real diminui.A vivência e a importância do peso e da forma corporal são distorcidas nesses indivíduos (Critério C). Alguns indivíduos acham que têm um excesso de peso global. Outros percebem que estão magros, mas ainda assim se preocupam com o fato de certas partes de seu corpo, particularmente abdómen, nádegas e coxas, estarem "muito gordas". Eles podem empregar uma ampla variedade de técnicas para estimar seu peso, incluindo pesagens excessivas, medições obsessivas de partes do corpo e uso persistente de um espelho para a verificação das áreas percebidas como "gordas". A auto-estima dos indivíduos com Anorexia Nervosa depende em alto grau de sua forma e peso corporais. A perda de peso é vista como uma conquista notável e como um sinal de extraordinária autodisciplina, ao passo que o ganho de peso é percebido como um inaceitável fracasso do autocontrole. Embora alguns indivíduos com este transtorno possam reconhecer que estão magros, eles tipicamente negam as sérias implicações de seu estado de desnutrição.Em mulheres pós-menarca, a amenorréia (devido a níveis anormalmente baixos de secreção de estrógenos que, por sua vez, devem-se a uma redução da secreção de hormônio folículo-estimulante [FSH] e hormônio luteinizante [LH] pela pituitária) é um indicador de disfunção fisiológica na Anorexia Nervosa (Critério D). A amenorréia em geral é uma consequência da perda de peso mas, em uma minoria dos indivíduos, pode na verdade precedê-la. Em mulheres pré-púberes, a menarca pode ser retardada pela doença. O indivíduo frequentemente é levado à atenção profissional por membros da família, após a ocorrência de uma acentuada perda de peso (ou fracasso em fazer os ganhos de peso esperados). Quando o indivíduo busca auxílio por conta própria, isto geralmente ocorre em razão do sofrimento subjectivo acerca das sequelas somáticas e psicológicas da inanição. Raramente um indivíduo com Anorexia Nervosa se queixa da perda de peso em si. Essas pessoas frequentemente não possuem insight para o problema ou apresentam uma considerável negação quanto a este, podendo não ser boas fontes de sua história. Portanto, com frequência se torna necessário obter informações a partir dos pais ou outras fontes externas, para determinar o grau de perda de peso e outros aspectos da doença.SubtiposOs seguintes subtipos podem ser usados para a especificação da presença ou ausência de compulsões periódicas ou purgações regulares durante o episódio actual de Anorexia Nervosa.Tipo Restritivo. Este subtipo descreve apresentações nas quais a perda de peso é conseguida principalmente através de dietas, jejuns ou exercícios excessivos. Durante o episódio actual, esses indivíduos não se envolveram com regularidades em compulsões periódicas ou purgações.Tipo Compulsão Periódica/Purgativo. Este subtipo é usado quando o indivíduo se envolveu regularmente em compulsões periódicas ou purgações (ou ambas) durante o episódio actual. A maioria dos indivíduos com Anorexia Nervosa que comem compulsivamente também fazem purgações mediante vómitos auto-induzidos ou uso indevido de laxantes, diuréticos ou enemas. Alguns indivíduos incluídos neste subtipo não comem de forma compulsiva, mas fazem purgações regularmente após o consumo de pequenas quantidades de alimentos. Aparentemente, a maior parte dos indivíduos com o Tipo Compulsão Periódica/Purgativo dedica-se a esses comportamentos pelo menos 1 vez por semana, mas não há informações suficientes que justifiquem a especificação de uma frequência mínima.Características e Transtornos AssociadosCaracterísticas descritivas e transtornos mentais associados. Quando seriamente abaixo do peso, muitos indivíduos com Anorexia Nervosa manifestam sintomas depressivos, tais como humor deprimido, retraimento social, irritabilidade, insónia e interesse diminuído por sexo. Esses indivíduos podem ter apresentações sintomáticas que satisfazem os critérios para Transtorno Depressivo Maior. Uma vez que esses aspectos também são observados em indivíduos sem Anorexia Nervosa que estão restringindo severamente sua alimentação, muitos dos aspectos depressivos podem ser secundários às sequelas fisiológicas da semi-inanição. Os sintomas de perturbação do humor devem, portanto, ser reavaliados após uma recuperação completa ou parcial do peso.Características obsessivo-compulsivas, tanto relacionadas quanto não relacionadas com comida, com frequência são proeminentes. A maioria dos indivíduos com Anorexia Nervosa preocupa-se excessivamente com alimentos. Alguns coleccionam receitas ou armazenam comida. Observações de comportamentos associados com outras formas de restrição alimentar sugerem que as obsessões e compulsões relacionadas a alimentos podem ser causadas ou exacerbadas pela desnutrição. Quando os indivíduos com Anorexia Nervosa apresentam obsessões e compulsões não relacionadas a alimentos, forma corporal ou peso, um diagnóstico adicional de Transtorno Obsessivo-Compulsivo pode ser indicado.

Outras características ocasionalmente associadas com a Anorexia Nervosa incluem preocupações acerca de comer em público, sentimento de inutilidade, uma forte necessidade de controlar o próprio ambiente, pensamento inflexível, espontaneidade social limitada e iniciativa e expressão emocional demasiadamente refreadas.Comparados com indivíduos com Anorexia Nervosa, Tipo Restritivo, aqueles com o Tipo Compulsão Periódica / Purgativo estão mais propensos a ter outros problemas de controle dos impulsos, a abusarem de álcool ou outras drogas, a exibirem maior instabilidade do humor e a serem sexualmente activos.Achados laboratoriais associadosEmbora alguns indivíduos com Anorexia Nervosa não apresentem anormalidades laboratoriais, a característica de semi-inanição deste transtorno pode afectar sistemas orgânicos importantes e produzir uma variedade de distúrbios. A indução de vómitos e o abuso de laxantes, diuréticos e enemas podem também causar diversos distúrbios, produzindo achados laboratoriais anormais.Hematologia: Leucopenia e leve anemia são comuns; trombocitopenia ocorre raramente.Química: A desidratação pode ser reflectida por um elevado nível de ureia sanguínea. Hipercolesterolemia é comum. Os testes de função hepática podem estar elevados. Hipomagnesemia, hipozinquemia, hipofosfatemia e hiperamilasemia são encontradas ocasionalmente. A indução de vómitos pode provocar alcalose metabólica (elevado bicarbonato sérico), hipocloremia e hipocalemia, e o abuso de laxantes pode causar acidose metabólica. Os níveis de iroxina sérica (T4) estão diminuídos. Hiperadrenocorticismo e resposta anormal a uma variedade de provocações neuroendócrinas são comuns.Em mulheres, baixos níveis de estrógeno sérico estão presentes, enquanto os homens têm baixos níveis de testosterona sérica. Existe uma regressão do eixo hipotalâmico-pituitário-gonadal em ambos os sexos, no sentido de que o padrão de secreção de hormônio luteinizante (LH) em 24 horas assemelha-se àquele normalmente visto em indivíduos pré-púberes ou na puberdade.Eletrocardiografia: São observadas bradicardia sinusal e, raramente, arritmias.Eletroencefalografia: Anormalidades difusas, reflectindo uma encefalopatia metabólica, podem decorrer de distúrbios hidroeletrolíticos significativos.Imagens cerebrais: Um aumento na razão ventricular-cerebral secundária à privação alimentar é vista com frequência.Dispêndio de energia em repouso: Frequentemente está reduzido.Achados ao exame físico e condições médicas gerais associadasMuitos dos sinais e sintomas físicos da Anorexia Nervosa são atribuíveis à inanição. Além da amenorréia, pode haver queixas de constipação, dor abdominal, intolerância ao frio, letargia e excesso de energia. O achado que mais chama a atenção no exame físico é a aparência emaciada. Também pode haver hipotensão significativa, hipotermia e pele seca. Alguns indivíduos desenvolvem lanugo (pêlos finos) no tronco. A maioria dos indivíduos com Anorexia Nervosa apresenta bradicardia. Alguns desenvolvem edema periférico, especialmente durante a restauração do peso ou na cessação do abuso de laxantes e diuréticos. Raramente, petéquias, em geral nas extremidades, podem indicar uma diátese hemorrágica. Alguns indivíduos evidenciam um amarelamento da pele, associado com hipercarotenemia. A hipertrofia das glândulas salivares, particularmente das glândulas parótidas, pode estar presente. Os indivíduos que induzem vómito podem ter erosão do esmalte dentário e alguns têm cicatrizes ou calos no dorso das mãos, causados pelo contacto com os dentes quando utilizam as mãos para induzir o vómito.A inanição da Anorexia Nervosa e os comportamentos purgativos às vezes associados a ela acarretam condições médicas gerais significativas. Estas incluem o desenvolvimento de anemia normocítica normocrômica, prejuízo da função renal (associado com desidratação crónica e hipocalemia), problemas cardiovasculares (hipotensão severa, arritmias), problemas dentários e osteoporose (consequência do baixo consumo e absorção de cálcio, secreção reduzida de estrógeno e maior secreção de cortisol).Características Específicas à Cultura, à Idade e ao GéneroA Anorexia Nervosa parece ter uma prevalência bem maior em sociedades industrializadas, nas quais existe abundância de alimentos e onde, especialmente no tocante às mulheres, ser atraente está ligado à magreza. O transtorno é provavelmente mais comum nos Estados Unidos, Canadá, Austrália, Japão e África do Sul, mas poucos trabalhos sistemáticos examinaram a prevalência em outras culturas. Os indivíduos que emigraram de culturas nas quais o transtorno é raro para culturas nas quais o transtorno é mais prevalente podem desenvolver Anorexia Nervosa, à medida que assimilam os ideais de elegância ligados à magreza. Factores culturais também podem influenciar as manifestações do transtorno. Por exemplo, em algumas culturas, a percepção distorcida do corpo pode não ser proeminente, podendo a motivação expressada para a restrição alimentar ter um conteúdo diferente, como desconforto epigástrico ou antipatia por certos alimentos.A Anorexia Nervosa raramente inicia antes da puberdade, mas existem indícios de que a gravidade das perturbações mentais associadas pode ser maior entre os indivíduos pré-púberes que desenvolvem a doença. Entretanto, também há dados que sugerem que quando a doença inicia durante os primeiros anos da adolescência (entre 13 e 18 anos de idade), ela pode estar associada com um melhor prognóstico. Mais de 90% dos casos de Anorexia Nervosa ocorrem em mulheres.PrevalênciaEstudos sobre a prevalência entre mulheres na adolescência tardia e início da idade adulta verificam taxas de 0,5 a 1,0%, para apresentações que satisfazem todos os critérios para Anorexia Nervosa. Indivíduos que não atingem o limiar para o transtorno (isto é, com Transtorno Alimentar Sem Outra Especificação) são encontrados com maior frequência. Existem dados limitados envolvendo a prevalência deste transtorno em homens. A incidência de Anorexia Nervosa parece ter aumentado nas últimas décadas.CursoA idade média para o início da Anorexia Nervosa é de 17 anos, com alguns dados sugerindo picos bimodais aos 14 e aos 18 anos. O início do transtorno raramente ocorre em mulheres com mais de 40 anos. O aparecimento da doença frequentemente está associado com um acontecimento vital estressante, como sair de casa para cursar a universidade. O curso e o resultado da Anorexia Nervosa são altamente variáveis. Alguns indivíduos com Anorexia Nervosa se recuperam completamente após um episódio isolado, alguns exibem um padrão flutuante de ganho de peso seguido de recaída, e outros vivenciam um curso crónico e deteriorante ao longo de muitos anos. A hospitalização pode ser necessária para a restauração do peso e para a correcção de desequilíbrios hidroeletrolíticos. Dos indivíduos baixados em hospitais universitários, a mortalidade a longo prazo por Anorexia Nervosa é de mais de 10%. A morte ocorre, com maior frequência, por inanição, suicídio ou desequilíbrio eletrolítico.Padrão FamilialExiste um risco aumentado de Anorexia Nervosa entre os parentes biológicos em primeiro grau de indivíduos com o transtorno. Um risco maior de Transtornos do Humor também foi constatado entre os parentes biológicos em primeiro grau de indivíduos com Anorexia Nervosa, particularmente parentes de indivíduos com o Tipo Compulsão Periódica/Purgativo. Os estudos de Anorexia Nervosa em gémeos descobriram taxas de concordância para gémeos monozigóticos significativamente maiores do que para gêmeos dizigóticos.Diagnóstico DiferencialOutras possíveis causas de perda significativa de peso devem ser consideradas no diagnóstico diferencial de Anorexia Nervosa, especialmente quando as características apresentadas são atípicas (tais como início da doença após os 40 anos). Em condições médicas gerais (por ex., doença gastrintestinal, tumores cerebrais, condições malignas ocultas e síndrome de imunodeficiência adquirida [AIDS]) pode ocorrer séria perda de peso, mas os indivíduos com esses transtornos em geral não têm uma imagem distorcida de seus corpos e um desejo de perder ainda mais peso. A síndrome da artéria mesentérica superior (caracterizada por vómitos pós-prandiais secundários à obstrução intermitente da saída gástrica) deve ser diferenciada da Anorexia Nervosa, embora esta síndrome possa ocasionalmente se desenvolver em indivíduos com Anorexia Nervosa, em razão de seu estado emaciado. No Transtorno Depressivo Maior pode ocorrer uma severa perda de peso, mas a maioria dos indivíduos com Transtorno Depressivo Maior não tem um desejo excessivo de perder peso ou um medo excessivo de ganhar peso. Na Esquizofrenia, os indivíduos podem apresentar um comportamento alimentar incomum e ocasionalmente experimentar uma perda de peso significativa, mas raramente demonstram o medo de ganhar peso e a perturbação da imagem corporal, necessários para um diagnóstico de Anorexia Nervosa.Algumas das características da Anorexia Nervosa fazem parte dos conjuntos de critérios para Fobia Social, Transtorno Obsessivo-Compulsivo e Transtorno Dismórfico Corporal. Especificamente, os indivíduos podem sentir-se humilhados ou embaraçados por serem vistos comendo em público, como na Fobia Social; podem apresentar obsessões e compulsões relacionadas a alimentos, como no Transtorno Obsessivo-Compulsivo, ou preocupar-se com um defeito imaginário em sua aparência física, como no Transtorno Dismórfico Corporal. Se os temores de um indivíduo com Anorexia Nervosa se restringem unicamente ao comportamento alimentar, o diagnóstico de Fobia Social não deve ser feito, mas os temores sociais que não têm relação com o comportamento alimentar (por ex., medo excessivo de falar em público) podem justificar um diagnóstico adicional de Fobia Social. Da mesma forma, um diagnóstico adicional de Transtorno Obsessivo-Compulsivo deve ser considerado apenas se o indivíduo apresenta obsessões e compulsões não relacionadas a alimentos (por ex., um medo excessivo de contaminação) e um diagnóstico adicional de Transtorno Dismórfico Corporal deve ser considerado apenas se a distorção não está relacionada à forma e ao tamanho do corpo (por ex., preocupação de que seu nariz seja grande demais).Na Bulimia Nervosa, os indivíduos apresentam episódios recorrentes de comer compulsivo, envolvem-se em comportamentos inadequados para evitarem ganhar peso (por ex., vómito auto-induzido) e preocupam-se excessivamente com a forma e o peso do corpo. Entretanto, à diferença dos indivíduos com Anorexia Nervosa, Tipo Compulsão Periódica/Purgativo, os indivíduos com Bulimia Nervosa são capazes de manter um peso corporal no nível normal mínimo ou acima deste.

Critérios Diagnósticos para F50.0 - 307.1

Anorexia Nervosa

A. Recusa a manter o peso corporal em um nível igual ou acima do mínimo normal adequado à idade e à altura (por ex., perda de peso levando à manutenção do peso corporal abaixo de 85% do esperado; ou fracasso em ter o ganho de peso esperado durante o período de crescimento, levando a um peso corporal menor que 85% do esperado).


B. Medo intenso de ganhar peso ou de se tornar gordo, mesmo estando com peso abaixo do normal.

C. Perturbação no modo de vivenciar o peso ou a forma do corpo, influência indevida do peso ou da forma do corpo sobre a auto-avaliação, ou negação do baixo peso corporal actual.

D. Nas mulheres pós-menarca, amenorréia, isto é, ausência de pelo menos três ciclos menstruais consecutivos. (Considera-se que uma mulher tem amenorréia se seus períodos ocorrem apenas após a administração de hormonio, por ex., estrógeno.)

Especificar tipo:
Tipo Restritivo: durante o episódio actual de Anorexia Nervosa, o indivíduo não se envolveu regularmente em um comportamento de comer compulsivamente ou de purgação (isto é, auto-indução de vómito ou uso indevido de laxantes, diuréticos ou enemas).

Tipo Compulsão Periódica/Purgativo: durante o episódio actual de Anorexia Nervosa, o indivíduo envolveu-se regularmente em um comportamento de comer compulsivamente ou de purgação (isto é, auto-indução de vómito ou uso indevido de laxantes, diuréticos ou enemas).

in http://virtualpsy.locaweb.com.br/dsm_janela.php?cod=11



20 de Março - Dia Mundial da luta contra a Anorexia